Meu filho tem alma de
cientista.
Falamos sobre o
movimento dos corpos celestes e sobre o Sol. E como sempre sei que
ele faz quando falamos do universo, enveredamos em uma conversa sobre
o corpo humano. Porque meu filho tem alma de alquimista e sabe, por
instinto, que assim como no alto é embaixo.
Falamos dos órgãos,
dos sistemas do corpo. Ele me explicava sobre rins e intestinos,
sobre cérebro, estômago e coração. E foi assim que o assunto
chegou ao lugar onde eu não sabia como ir além. O que acontece
quando o coração para?
“O sangue volta pro
coração. Para de correr pelas veias, e os outros órgãos param de
funcionar. Então a pessoa morre.”
O coração do vovô
Antônio parou. Uma doença do coração, por ele ser velhinho. Foi
por isso que ficamos fora o fim de semana, eu e o papai. Para ajudar
a vovó em todas as coisas que precisam ser feitas quando uma pessoa
morre.
E que coisa tão
alienígena e natural é a morte para um cientista.
“Eu não gosto quando
as pessoas morrem.” E me vi inquirida. Porque “doença” assim,
genericamente, não bastava. Era preciso saber que doença. Que fato
preciso. Um infarto. E como é um infarto? O que causa isso? O que
faz um coração parar de funcionar de repente?
“Eu não gosto quando
as pessoas morrem. E quando as pessoas ficam muito velhas elas morrem
as vezes. Em algum momento as pessoas todas morrem.”
Sim.A morte é parte do ciclo. Assim como o nascimento. Todas as pessoas nascem.
Ficamos abraçados
muito tempo. “Que coisas é preciso fazer quando as pessoas
morrrem?” Quando as pessoas morrem, o corpo volta para a terra.
Falei sobre parentes vindos de longe, e por alto, de arranjos que
precisavam ser resolvidos, e que os adultos também choravam quando
uma pessoa morre. Expliquei para olhos atentos, que eu acredito que
quando o corpo morre sobra a alma. Que ela permanece, ainda que em
outro lugar. Que a alma pega um barco que a leva para outro mundo,
onde ela passa a cuidar dos vivos. Que eu acredito que agora, o vovô
cuidaria dele sempre, que o protegeria.
Ficamos em silêncio,
eu e ele. Esperei que se afastasse, apaziguado mais por suas certezas
científicas do que por minhas saídas espirituais. Ele disse que
queria jogar psp. Queria ficar sozinho, se distrair e ruminar aquilo.
Então eu pude vir
aqui, sofrer um pouco porque crianças não deveriam precisar receber
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